Como o manejo pré-abate influencia na qualidade da carne?

Postado em: 10/08/2022 | 4 min de leitura Escrito por:
A forma como os manejos diários são realizados com os animais pode expô-los a situações que desencadeiam uma resposta inflamatória induzida pelo estresse. Essas situações impactam muito a saúde, o desempenho e o bem-estar do rebanho, bem como a qualidade da carne produzida, afetando também a lucratividade geral das operações pecuárias.

O termo estresse é definido como a reação de um animal a fatores que potencialmente influenciam sua homeostase, ou seja, o equilíbrio do seu organismo. Os bovinos são expostos a diversas situações de manejo que os expõem à ocorrência de estresse, como vacinação, desmame, transporte entre fazendas, transporte para curral, confinamento e abate, novos ambientes, manejo, restrição de água e ração, entre outros. Esses fatores, também conhecidos como estressores, podem ser categorizadas como:
  • Estressores psicológicos: desmame, chegada a um novo ambiente, mistura de lote;
  • Estressores físicos: castração, hematomas (brigas ou agressões), abscessos de vacinação, descorna;
  • Estressores fisiológicos: alterações endócrinas e metabólicas decorrentes de estressores psicológicos e físicos.
Normalmente, os animais são expostos a vários estressores ao longo do ciclo de produção que provocam uma resposta ao estresse. A resposta induzida pelo estresse é indispensável e necessária para a retomada da homeostase, porém possui efeitos negativos na saúde e desempenho do rebanho.

Estresse pré-abate e qualidade da carne

O estresse que os animais enfrentam antes do abate está sob holofote dos consumidores de muitos lugares do mundo. A opinião pública vem pressionando a indústria a adotar cada vez mais melhores práticas de manejo e transporte, exigindo informações sobre a origem dos alimentos e como os animais foram criados ao longo de sua vida produtiva, com foco especial no bem-estar animal.

Portanto, é imprescindível entender o(s) fator(es) que podem causar uma resposta induzida pelo estresse em animais em terminação, como essas situações afetam a qualidade do produto final (ou seja, a carne) e a aceitabilidade do cliente.


Várias situações estressantes são enfrentadas por um animal desde o confinamento ou pasto até o abate, incluindo o manejo na fazenda, agrupamento de animais, carregamento do caminhão, transporte próprio, descarregamento do caminhão no frigorífico, condições climáticas, novo ambiente e manejo, bem como privação de ração até o abate.

Essas situações, que podem ocorrer em conjunto, também desencadeiam uma resposta inflamatória induzida pelo estresse que pode impactar nas características da carcaça e, consequentemente, nos aspectos visuais e qualitativos da carne ofertada no mercado. Mais especificamente, animais expostos a um maior número e/ou magnitude de estressores físicos e psicológicos antes do abate são mais propensos a produzir a carcaça escura, dura e seca (DFD).

Todos os estressores pré-abate podem, inevitavelmente, alterar a qualidade da carne e sua aceitação pelo cliente, principalmente devido ao aumento do pH da carne e mudanças na maciez e cor do produto. O pH da carne é resultado da quantidade de níveis de glicogênio pré-abate presentes nos músculos, que, por sua vez, depende muito do manejo pré-abate e estresse físico e psicológico. A exposição a estressores antes do abate resulta em redução de energia muscular, depleção de glicogênio e alterações em importantes atributos físicos e químicos da carne, como pH, maciez e cor.

A cor é o atributo sensorial que mais influencia as decisões de compra dos clientes, pois associam uma cor vermelho cereja brilhante com frescor e qualidade. Há uma associação positiva entre o pH e os parâmetros colorimétricos de animais de corte mestiços.

A maciez da carne também é um fator frequentemente alterado devido ao estresse pré-abate. A maior força de cisalhamento, que indica um corte mais duro, em cortes DFD pode estar relacionada a um menor comprimento do sarcômero (unidade contrátil da fibra muscular), reconhecido como uma importante causa do aumento da dureza da carne. O comprimento do sarcômero aumenta conforme o pH diminui abaixo de 6,2.

O estresse em si não é o único fator que predispõe a ocorrência de DFD em ruminantes. Sexo, raça (Bos taurus vs. Bos indicus), nutrição, categoria animal (touro vs. boi), temperamento e idade são outros fatores importantes que influenciam a ocorrência de DFD.

No México, pesquisadores relataram que 13,5% das carcaças mestiças Bos indicus processadas por um abatedouro foram classificadas como DFD, enquanto esse valor se aproximou de 2% em uma pesquisa recente realizada nos EUA. Embora nenhum dado tenha sido relatado, as raças Bos indicus são bem conhecidas como mais temperamentais do que as raças Bos taurus. Assim, esses animais apresentam estresse intensificado, o que pode sugerir que a ocorrência de DFD seja maior em rebanhos de B. indicus em comparação com B. taurus.

Além da variação entre as raças, a variação de temperamento dentro das raças também pode afetar a resposta ao estresse e as características da carcaça. Pesquisas demonstraram que os animais Bos indicus mais temperamentais tinham uma maior contagem de hematomas na carcaça, índice de cor reduzido, teor de gordura e pontuação de marmoreio.

Ruminantes são frequentemente expostos a situações estressantes durante toda a sua vida produtiva, que predispõem os animais a perdas de saúde, desempenho e, portanto, qualidade da carne e experiência do consumidor. Portanto, é imprescindível que nos atentemos aboas práticas de manejo, reduzindo ao máximo as situações estressantes aos animais. Além disso, tecnologias podem ser utilizadas para reduzir as perdas causadas pelo estresse com consequente melhora da qualidade da carcaça, melhorando a aceitabilidade dos produtos pelos consumidores.

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Fonte:

Effects of Pre-Slaughter Stress on Meat Characteristics and Consumer Experience, por Bruno I. Cappellozza e Rodrigo S. Marques, do livro Meat and Nutrition, editado por Chhabi Lal Ranabhat. Acesso em 02 ago 2022. 

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